segunda-feira, janeiro 11, 2010

Em busca do Velo de Oiro

«Algum dia eu haveria de entrar na normalidade dos que te amam. Amo-te. E dói escrevê-lo (que é pior, meu amor, do que dizê-lo). Amo-te, absoluta, impossível e fatalmente. E ouço, adolescente, uma música adolescente, para me lembrar de ti, porque lembrar-me de ti é lembrar-me que não consigo esquecer-te.
E ouço música porque ouvimos música quando amamos, e tudo, no amor, é música, acústica da alma que se quer ser devorada, e, neste caso, dor (tão deliciosamente insuportável) de amar sem sequência nem expectativa de contrapartida, amar unicamente o puro objecto que desgraçadamente amamos.

Isto é uma carta de amor, e é possivelmente ridícula (prova maior de que é, realmente uma carta de amor), ou porque perdi o hábito de as escrever, ou porque nunca tive a coragem de as enviar. Não percebes porque é que não te falo? Ainda não percebes que, na personagem que de mim eu enceno, não cabe a ameaça de uma derrota, a antecipação do desencanto, a sombra de um vexame? Não te falo, para não saber que o que eu te digo é apenas a forma contida de te dizer outra coisa, mas que essa coisa não é do teu mundo, nem do mundo que eu construí, nem do precário mundo que a nossa fragilíssima ternura mútua arquitectou. E tudo isto é literário, eu sei, mas – que queres? -, a literatura é o melhor de mim e é o melhor de mim que vive dentro da minha cabeça quando estou contigo.

E depois, afastamo-nos. Beijo-te a correr, não sei se já reparaste, e quase fujo, porque sair do pé de ti é regressar ao que não és tu, o teu olhar e as tuas mãos, a tua alma e a tua voz, e isso, meu amor, transformou-se no insuportável intervalo entre dois encontros. Esta carta de amor é um excesso (e isso prova superiormente que é uma carta de amor): eu amo não a ideia de amar-te (durante muito tempo, eu julguei que era apenas isso), mas a ideia de perder-me no meu amor por ti. E mesmo amar-te é um excesso, porque tudo aconselharia que eu me limitasse a mitificar-te, que é a melhor forma de evitarmos enfrentar a realidade. Porque a realidade, aqui, é como uma dor difusa, tu sabes como é, um incómodo ainda não localizado, que progressivamente se vai definindo e acertando, até que, insuportavelmente nítida, a sua imagem se nos impõe como uma evidência. A minha dor é que eu comecei a amar-te, sem o saber, durante aquele breve período de tempo em que sair de casa era a promessa reconfortante de ver-te e falar contigo. Eu não sabia, repito, mas o tempo ajudou-me a definir essa pequena dor, tão secretamente pavorosa: cada vez que estou contigo (cada vez mais, meu amor, cada vez mais) é como se a minha vida se virasse do avesso. E é verdade, é cada vez mais verdade, que, quando penso nas coisas que ainda me falta fazer na vida, é em ti que penso. E tenho medo, como um animal que instintivamente foge do que sabe não poder atingir.

Eu penso em ti, ainda mais do que te digo, e tu estás em tudo, mesmo quando não te penso, tu és a grande razão, o horizonte sem nome que constantemente se desenha na minha imaginação de mim. Há uns anos, este seria o momento de desmontar o discurso desta carta, de te mostrar os subtis mecanismos da alma e da máscara, de desdizer ironicamente o que já disse, de insinuar que, afinal, as-coisas-talvez-não-sejam exactamente-assim. Mas as coisas são exactamente assim, e a carta, que poderia transformar-se num confortável exercício paródico, é, inevitavelmente, uma agonia e um embaraço. Esta carta é um acto de puro egoísmo, que eu até talvez nem tivesse o direito de praticar. É-te incómoda, necessariamente, e isso bastaria para que eu me abstivesse de a enviar, dentro de um envelope azul. Mas o azul fica-te tão bem, e as cores todas ficam em ti como tu ficas no mundo: exactamente.

Mas, repito: esta carta é um acto de puro egoísmo, é como se não tivesse destinatário. E, no entanto, é preciso enviá-la, para que seja uma carta de amor, para que faça sentido como carta. Para que seja amor. Mas podemos imaginar uma saída elegante: para que possas conservá-la como pura carta de amor, quero eu dizer, sem o embaraço de saberes que ela te foi escrita por alguém que não amas, não a assino.

Dou-te tudo: até a hipótese de esta carta não ter sido escrita por mim. (E não, esta carta não pode ter sido escrita por mim. És tu – em mim – que me faz escrever o que eu não escrevo. E isso é – de novo – o melhor de mim.)»


Amor de António Mega Ferreira

segunda-feira, março 31, 2008

Um espécie de romantismo

Quem me conhece sabe que sou uma romântica. Sei dizer coisas românticas, sei comportar-me de forma romântica, enfim, numa escala de 1 a 10, dou-me a mim própria 10. Sim, a nota máxima. Sempre achei um disparate aquela história dos professores não espetarem um 20 a vermelho no teste só porque não, porque não se dá 20’s a não ser aos génios. E não estou com isto a dizer que sou genialmente romântica, embora pudesse dizê-lo (está fácil de ver que deixei a modéstia em casa hoje). Enfim, voltando ao tema: o meu temperamento romântico. Estou com vontade de escrever um post romântico, mas não sei bem por que ponta pegar-lhe. Quer dizer, quando me pus aqui a escrevinhar até estava com uma fisgada, mas… o link que queria deixar para servir de base ao meu post romântico não abre nem à lei da bala. E agora não sei o que dizer. Bom, talvez deixar um “obrigada” aos três ou quatro leitores que teimam em visitar o peixe, mesmo depois de tantos dias sem dizer palavra. Bem vistas as coisas, até estou a ser amorosa, verdade?

Voltei. Até ver…

segunda-feira, janeiro 07, 2008

Blues para o homem que pensava já não saber cantar

The State of Being Orderly But Unconsious, 1997 by Wang Jiazeng
Acordou... deixou-a ir e teve medo do escuro... vegetou... angustiou e finalmente, muito depois, decidiu lavar-se. Há anos que não se banhava!
Enquanto se lavava pensou no Kundera e a voz arrancou-lhe um cruel: “A vida não é aqui”!
Mas estava tão quente que voltou a adiar e saiu do banho.
Ficou assim, morno e quieto, até ter vindo, sabe-se lá de onde, o frio! Não é importante o que nos querem dizer com as palavras, somente o que delas sentimos.
Voltou a lavar-se. O que queria mesmo é que o lavassem. Trauteou:
“Se não sabes cantar quem é que te vem aplaudir?
Se não sabes amar quem é que te vem aconchegar?
Se só sabes morrer, ninguém te virá enterrar!”
Parou! O pensamento passou à frente e já não conseguia escrever o que tinha cozinhado segundos atrás! Brincou com as palavras mas eram apenas socos no estômago. Meu Deus (que egoísmo) que vazio…
Inventou uma sequência que deixara de ser o que sentia. Estava sempre a inventar. Desculpas.
Há bainhas que passam demasiado tempo sob os sapatos.
Há merdas que nem raspando. Secam!
O animal olhou-o angustiado. Também ele. O que queria mesmo era que também o levassem a passear. A vida, não era mesmo ali! Voltou para o banho. Tinha mesmo que se lavar. Tinha mesmo passado muito tempo. Tinha mesmo que… O gatilho estava no limite do clique mas antes iria fumar mais um. A névoa protege porque nos desvia constantemente o olhar. Azul.
Voltou a adiar. Não chegou a entrar no banho. A água limpa mas dilui. A última coisa que queria era esquecer-se. Talvez um banho seco. Clique!
Abriu a tampa e começou a escrever:
“Acordou... deixou-a ir e teve medo do escuro... vegetou... angustiou e finalmente, muito depois, decidiu lavar-se. Há anos que não se banhava! “

quinta-feira, dezembro 13, 2007

Mimos

Já há pensos que substituem a beijoca milagrosa da mamã no dói-dói da criancinha. Acho que nada que impede os crescidos de usá-los também. Dá cá um beijinho que isso passa.

terça-feira, dezembro 11, 2007

O peso da responsabilidade

O título foi descaradamente roubado de uma crónica muito interessante, assinada pelo Dr. Bakali (o nome soa àqueles curandeiro-feiticeiros africanos que aparecem nos classificados dos jornais, mas a verdade é que o senhor escreve bem, gosto de lê-lo) que li na Blitz deste mês. Na dita, resumidamente, o Dr. Bakali faz referência a uma petição que andou a circular na Internet, sobre um artista chamado Guillermo Vargas, que supostamente deixou morrer à fome e à sede um cão vadio que manteve em exposição numa galeria. Para começar, explique-se qual era o objectivo do artista ao expor o animal: alertar para o perigo que os cães vadios representam para os humanos (parece que um miúdo morreu depois de ter sido violentamente atacado por dois cães numa rua da Costa Rica). Faço parte do extenso universo daqueles que receberam a petição e, quando li o texto, além de chocada, fiquei convencida de que a história era verdadeira. Resultado, lá fui eu a correr acrescentar o meu nome, de forma a impedir que o senhor Vargas participasse numa qualquer bienal europeia de arte. E aquilo que diz a crónica do Dr. Bakali é que a história apenas é verdadeira em parte, ou seja, na realidade o artista expos o animal, mas é mentira que o deixou morrer, parece que o cão conseguiu fugir. Pelos vistos, e ainda de acordo com as palavras do Dr. Bakali, aquilo que aconteceu é que Vargas terá dito, durante uma entrevista posterior à fuga do bicho, que era sua intenção deixá-lo morrer. Portanto, foi essa revelação que deu origem à indignação generalizada. O artista não deixou morrer o cão, muito embora pudesse ter sido essa a sua intenção, continuo a achar chocante a iniciativa de expor o animal, apesar de perceber o que passou pela cabeça do homem, mas aquilo que realmente me deixou a pensar foi o facto de ter embarcado na história da petição sem me ter dado ao trabalho de confirmar se era verdadeira. E realmente, na imensidão que é o mundo cibernético, cada um de nós é responsável sempre que faz um simples forward. É o tal efeito “carneirada” que tanto me irrita e no qual caí que nem um patinho. Enfim, só espero que o cão continue vivo e que não se vingue da atitude do artista abocanhando a perna de alguém que lhe passe à frente.

terça-feira, dezembro 04, 2007

O meu aplauso

Há quem diga que quem diz fonix quer na realidade dizer foda-se (desculpem-me a expressão, que eu até nem sou rapariga de dizer palavrões, mas agora impunha-se). Sempre contrariei a teoria. Para mim, dizer fonix não é o mesmo que dizer o palavrão (e agora sim, já é escusado repeti-lo). Fonix é expressão de puto? É, concordo. "Fonix pá, cena marada... e tal!". Os putos dizem-no assim? Dizem. E isto só por si é razão que baste para algumas pessoas se sentirem incomodadas com o nome da nova operadora móvel criada pelos CTT? É de mau gosto a fonética da palavra... Pffff! Pois eu aplaudo. Aplaudo quem teve a ideia e quem assinou por baixo. Ainda bem que há portugueses que não são cinzentões, fonix.

quinta-feira, novembro 15, 2007

Habbo ladrão não tem perdão

Meter a chave à porta e encontrar a casa “despida” é uma situação que deixa qualquer um de cabelos em pé, pelos vistos mesmo quando essa casa é virtual. Achei uma certa piada à ideia de um puto de 17 anos, creio que de nacionalidade holandesa, que se tornou membro do Habbo Hotel, uma comunidade virtual com mais de três milhões de jogadores, e resolveu rechear o seu quarto com móveis gamados a outros “habbos”. A história meteu polícia ao barulho (uma espécie de Polícia Judiciária virtual, será?), porque a malta que ficou sem o recheio da casa pagou por ela em créditos, que por sua vez são pagos em dinheiro real. Parece que o miúdo foi detido por “hacking” e roubo e, imagino eu, os lesados terão recuperado os móveis roubados. Não sei se a diversão do rapaz terá valido para o susto, mas palpita-me que sim.